27 de março de 2011

In Memoriam: Revisitando o pensamento do professor José Luis Poças Leitão Conceição Silva




Os estudiosos do problema da fome declaravam no final do século XX (segundo milênio) que no século XXI a alimentação de toda a população mundial estaria garantida não só porque a produção de alimentos seria suficiente, mas também, que a sua distribuição equitativa estava garantida. Perspectiva que foi acordada amplamente pela Food and Agriculture Organization (FAO). Infelizmente, parece que está sucedendo precisamente o contrário.



O problema da fome em quase todo o mundo tende a agravar-se. Dos quase sete bilhões de habitantes a que em breve chegará a população mundial, pelo menos dois bilhões passam fome ou são mal alimentados. Esse extraordinário número de indivíduos se encontra, sobretudo, na África e na Ásia. Ao contrário da Europa e das Américas que têm alimentação farta e podem até mesmo exportar. No entanto, também ali mesmo, registram-se problemas por falta de poder de compra de alimentos, como, por exemplo, nos EUA onde cerca de trinta milhões de pessoas recorrem à distribuição de “sopa gratuita” para evitar ou, pelo menos, amenizar a fome.



Esse grave problema é, constantemente, analisado e discutido e propostas de solução são apresentadas. Contudo, não se chega jamais a uma solução definitiva. Parece mesmo que o velho Malthus tinha razão e acertou na sua previsão. Mas, em minha opinião (já publicada várias vezes) a solução existe podendo e devendo ocorrer a partir do Brasil.



Essa posição é sustentada por um estudo experimentado e exposto no livro Manejo Ecológico do Solo (1979) da professora Ana Primavesi. Grande mestra no estudo da agronomia que antes de morrer publicou uma espécie de Relatório no qual se queixava da total falta de iniciativa por parte do Governo e dos órgãos técnicos especializados em tentar, de qualquer maneira, levar à prática a sua proposta, provando que sua adoção em todo o mundo acabaria, definitivamente, com o problema da fome.



Eu tentei de várias formas conseguir alguém com condições para praticar essa nova tecnologia e que se interessasse pelo assunto, mas também não consegui qualquer apoio. Contatei com diversas organizações desde o “Movimento dos Sem Terra” (MST) ao Ministério do Desenvolvimento Agrário (MDA), mas nada consegui. Agora, no entanto, como a idade e o estado de saúde já não me vão permitir ir para o campo e orientar um grupo de trabalhadores interessados no novo processo usando a tecnologia estudada por Ana Primavesi, resolvi expor aqui o melhor que puder, resumidamente, o esquema de trabalho a realizar e tentar a divulgação e a sua publicação no MIL, mantendo, assim, a esperança de iniciar a salvação da humanidade, riscando de seu destino a miséria provocada pela fome. Na tecnologia proposta por Ana Primavesi, dispensa-se o uso de mecanização pesada, agrotóxicos e monocultura em áreas grandes.



Um grupo de agricultores (mais de 4) trabalhando coletiva e comunitariamente executará o projeto. Não haverá “patrão” comandando (um trabalho executado por um grupo de trabalhadores comandados por um patrão é uma prática que lembra a escravatura). O solo será cavado com enxada até uns 15 cm de profundidade e ajuntado para formar camalhões (canteiros) com o máximo de largura de 1,8 metros (180 cm) considerando-se 1,6 metros (160 cm) a área produtiva. O camalhão terá cerca de 35 a 40 centímetros de altura.



A análise do solo levará à necessidade de juntar minerais (não industrializados) e matéria orgânica. Para garantir a fertilidade os camalhões serão irrigados. Ana Primavesi diz no seu livro que um solo assim preparado terá por área de 0,3 metros quadrados (30 decímetros quadrados) e 50 centímetros de profundidade, cerca de 5 trilhões de microorganismos. São eles que garantem a fertilidade. Todo o camalhão será povoado de minhocas cujo número deverá atingir, antes de um ano de trabalho, 400 a 500 por metro quadrado. Toda a matéria orgânica se transformará em húmus de minhoca. As minhocas aproveitarão, também, as raízes e restos das plantas produzidas, em húmus.



Deve, ainda, juntar-se matéria orgânica vinda de fora, sobretudo lixo orgânico de povoações, para garantir a abundância desse ótimo fertilizante. No camalhão serão plantadas todas as espécies de vegetais adaptados ao clima da região e de acordo com o plano de exploração desejado pelos produtores. Como toda a superfície do camalhão tem o mesmo grau de fertilidade, as plantas, até mesmo árvores e arbustos, serão plantadas o mais perto possível, respeitando apenas a incidência do sol. Do que for produzido, uma parte será para o consumo humano (alimento) e outra para a pecuária. O que restar será para as minhocas.



Admite-se, e tentará provar-se, que a produção nos camalhões poderá ser até dez vezes maior do que de uma área igual cultivado pelo sistema tradicional. Pode concluir-se que, com esta tecnologia, a produção mundial de alimentos que hoje poderá atingir no máximo 8 bilhões de pessoas, alimentará mais de 20 bilhões, mesmo que a área utilizada se reduza a metade da atual. Porém, acredito que muito dificilmente a população mundial poderá atingir este número por razões de dificuldades de povoamento diferentes das da alimentação.

3 comentários:

romulo disse...

Bravo Conceição Silva, li recentemente um artigo de sua autoria no JOU de 75, um jornal alternativo em que colaborei. Essa chama é pra geração da agrofloresta e permacultura levar adiante.

Lúcia Helena disse...

Conceição Silva é homem extra-ordinário. Lúcido, apesar da idade avançada e doente, ainda crê que políticos sérios possam apreciar trabalhos sobre a reforma agrária,o cooperativismo. O cuidar da terra e da Terra. Oxalá isso aconteça. Afinal não será isso a instalação do novo Reino? O propalado Reino do Espírito Santo
em toda a sua concretude?

Sara Seilert disse...

Refazendo tudo... Guariroba!