‘Mito’, Bolsonaro apresenta
amontoado de clichês na área
econômica
Propostas assustam a quem sabe somar,
diz analista político
MELILLO DINIS
01.out.2017 (domingo) - 6h00
atualizado: 01.out.2017 (domingo) - 8h05
01.out.2017 (domingo) - 6h00
atualizado: 01.out.2017 (domingo) - 8h05
BOLSONARO: A
ECONOMIA ESTÚPIDA!
O Brasil vive enorme vácuo político. Depois de décadas
de democratização a qualidade da política e de nossos
políticos é uma vergonha. Em crises, e a quase um ano das eleições
presidenciais,
do Congresso Nacional e dos governadores,
procuramos opções que não estejam enlameadas pela corrupção nem
contaminadas pela incompetência. Quanto ao próximo presidente
da República, muitos falam da necessidade de buscar um personagem
fora da política. Outros oferecem uma destas figuras típicas da tradição
autoritária latino-americana: Jair Bolsonaro.
Com ares de mito, o deputado de 62 anos, que está em seu
6º mandato em Brasília, tem pouquíssima novidade. Mas é no
campo da economia que a tragédia de seu pensamento
assusta a quem sabe somar. Seus pressupostos são
totalmente reunidos em um amontoado de clichês:
Estado mínimo, opção exclusiva pelas privatizações,
bilateralismo nas relações comerciais e nas trocas
internacionais, resolução da questão social brasileira
por meio das polícias (menos violência igual a mais consumo),
nada de inclusão ou de diálogo com as forças sociais,
econômicas e produtivas, subsídios a setores “estratégicos”,
barreiras tarifárias e não-tarifárias para importados,
entre outros chavões. É o que chamo de economia estúpida.
Tal conjunto de propostas “econômicas” evidencia o limite
deste outsider que é um insider na
política com 20 anos de
presença congressual. Nos muitos desafios que o Brasil
exige nesta mudança de época da vida nacional, o eventual
candidato apenas titubeia em torno de umas poucas palavras,
sem nenhuma consistência econômica e política.
Claro que a decisão do eleitor em escolher o “seu”
candidato não se resume meramente aos temas econômicos
diretos e indiretos. Mas se formos medir o que teremos com
Bolsonaro, pelo que lemos e escutamos de sua parte e de
seus seguidores, não há esperança.
Curiosamente, a ideia de mito político que os torcedores de
Bolsonaro trazem em suas aparições pelo país apenas
demonstra a razão da escola junguiana em pensar que os
mitos revelam o nosso inconsciente coletivo: fragilidade,
medos e incertezas acerca do futuro no caso brasileiro.
O “mito” é apenas o pesadelo de nossos tempos!
As atuais pesquisas apenas registram este triplo
sofrimento e outros mais que estão pulsando
enquanto convivemos.
A gravidade das candidaturas “emocionais”, como a de
Bolsonaro, apenas se acentua quando se deposita na sua
imagem a ideia de um gênio solitário, mesmo que o
personagem esteja desprovido de conteúdo. A salvação
nacional em torno de um único político não funciona
em um país cuja governabilidade é tema tão complexo
que exige uma competência mínima, não só dos candidatos,
mas dos partidos e das equipes, do parlamento, das instituições,
do mercado e das organizações sociais.
As emoções mais primárias que o candidato tenta despertar é
apenas um apelo de campanha. Não é sequer uma estratégia
de (des)governo. E, por enquanto, ele não oferece um
pensamento econômico porque não o possui e porque não será
capaz de
imaginar algo diferente de que um conjunto de frases feitas,
muitas delas gritadas
aos seus inimigos (todo aquele que não pensa como ele).
O Brasil precisa retomar sua estabilidade econômica e
institucional, além de recuperar um mínimo de confiança
na política. Necessita de práticas que incorporem as conquistas
da democracia e garantam um mínimo de equilíbrio, começando
pelo emocional, social e econômico. Isto não irá ocorrer por conta
de uma pessoa, mas de um projeto nacional em que homens e
mulheres retomem seu protagonismo no modo de fazer a política.
Se não for modificada a política, seus sistemas, personagens e
mecanismos eleitorais, apenas elegeremos a próxima crise em
2018. Para tanto, é necessário começar pela mudança do
clima social antagônico, beligerante e intolerante, e propor
mais e melhores soluções aos problemas reais.
Muita gente não deseja isto. Desconfiem deles mais que nunca.
O tempo não é de piromaníacos, mas de cidadãos que transformem,
com respeito, diálogo, algumas propostas modestas,
mas inteligentes, em ação e que estas funcionem.
O que temos hoje é apenas um ensaio do futuro que o Brasil exige.