27 de fevereiro de 2012


A flor de maracujá,
o por do sol, o parreiral,
Emanuel Medeiros Vieira
e outras imagens




Guaraciaba-SC. Fotos: Celso Martins

Emanuel prepara um
novo livro de contos

O escritor Emanuel Medeiros Vieira passou todo o período de Carnaval “revisando as provas do meu novo livro de contos”, escreve. “Lendo, relendo. Sem parar. Ou eu terminava com a revisão ou ela terminava comigo.... Ufa! Terminei! Terás uma surpresa”, acrescenta.
No momento Emanuel se encontra em Brasília, onde residiu por quase três décadas, devendo retornar a Salvador-BA nos próximos dias. Confira seu último texto:


G A M B I A R R A

Por EMANUEL MEDEIROS VIEIRA

(...) “Vivendo sempre no obstruído, no precário, no inerte, no disforme, no incerto, no rígido, no aterrorizador, no inóspito, no nu, no enfermiço, no vacilante, no desguarnecido, no nu, no enfermiço, no vacilante, no desguarnecido, no inóspito, no lúdico”. (...)
(Enrique Vila-Matas, “Dublinesca”)

Brasil: gambiarra infinita –
atravessando o tempo e as caravelas,
os Inss, cartórios, jeitos, jeitinhos, golpes, democracias formais –
segue, gambiarra, até a consumação dos tempos,
vem geração, vai geração – estás sempre aí –
arrumando fios na clandestinidade ou às claras,
a gente sabe quem paga a conta
tudo inconcluso
navegar é preciso
gambiarra de simulacros – como se uma peste surgisse no porto de Santos
e acordasse feliz no Brasil inteiro,
com seus carnavais, feriados, e com o seu esquecimento,
e o pó chegará para todos – celebridades vãs, engenhocas eletrônicas, vestidos caros, futilidade, enganação, truques mentais.
Tudo seria recomeçado depois de uma bomba nuclear,
uma flor pequena, um velho de boina, um menino, uma regata – e o mar.
Segue o teu destino, gambiarra – segue em paz,
aguentaremos o teu fedor – sempre.
(Como temos suportado até agora com a nossa “alegria”, nosso samba, nossos mandões tão idiotas e tão presunçosos, nossos velhacos sempre iguais – paródias de si mesmos.)
Mas relembro: um menino, um velho, uma regata – e o mar.

(Brasília, fevereiro de 2011)

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A G R E G A R

POEMA DE EMANUEL MEDEIROS VIEIRA*


“Não Matarás”: não basta.

Teu mandamento será este: farás tudo para que o outro viva.

É vero sim o que quero:

não me importa o estoque de teu capital, Brasil,

mas tua capacidade de: amar

lavrar

aspirar

compreender.

Esse estatuto de miséria não é o nosso,

e a tecnologia da última geração não me sacia:

meu coração navegador quer mais.

A Ética – cuspida, debochada, no reino do simulacro,

Virou produto supérfluo porque não tem valor contábil.

Tempo dessacralizado e sem utopia:

a esperança é um cavalo cansado?

A aventura acabou no mundo?

Seremos apenas meros grãos de areia na imensa praia global?

Habitantes de um mundo virtual neste mercado sem cara?

Soará pomposo, eu sei:

não deixemos que nos amputem a alma

(e que acolhamos o outro).

Ser gente: não mera massa abúlica, informe, com os olhos colados

no retângulo luminoso de todas as noites.

O tempo é apenas dos alpinistas sociais?

Sou bom porque apareço, não apareço porque sou bom.

Na internet a solidão é planetária.,

mas do abismo – fragmento – irrompe um menino eterno,

e sentes o cheiro de uma manhã fundadora.

(A Morada do Ser é mais importante que o poder/glória.)

E o poema resiste,

singra a eternidade,

despista a morte,

seu estatuto não é mercantil.

Já não esqueces o essencial:

Na estrada de pó e de esperança, acolhes o outro.


*Este texto obteve o Primeiro Lugar no Concurso Nacional de Poemas, promovido pela Associação de Cultura Luso-Brasileira, de Juiz de Fora, Minas Gerais, sendo contemplado com a Medalha de Ouro “Jacy Thomaz Ribeiro.” O tema do concurso foi “Solidariedade: Por um Mundo Melhor.”
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