1 de maio de 2014

"Agostinho da Silva nos seus primeiros anos de Brasil: Política e Educação", por Romana Valente Pinho


“Portanto, a primeira coisa que apontaria na minha estada 

no Brasil foi a abertura de mim próprio, eu fui outro. [...] 

De qualquer maneira, o primeiro ponto da chegada ao Brasil foi este 

– abrir-me a mim. O segundo ponto foi o de descobrir no Brasil 

aquele Portugal que nunca mais me desapareceu do espírito [...] "                   
                                                                    Agostinho da Silva, Vida Conversável, 1994
Porque vai Agostinho da Silva para o Brasil no ano de 1944?
Porque escolhe Agostinho da Silva o Brasil para emigrar

e não outro país?
Poder-se-á dizer que a ida para o Brasil é uma iniciativa 

muito ponderada, já que o autor esteve preso por questões 

político-religiosas entre o fim de Junho e o início de Julho

de 1943 e só para lá emigra em Novembro de 1944. Teve, 

portanto, muito tempo para pensar e toma tal decisão em família. 

No fundo, o Brasil era-lhe não só um país familiar (na medida 

em que a sua mãe havia vivido em Vitória do Espírito Santo 

quando era jovem) como lhe transmitia uma enorme sensação 

de liberdade, já que estava muito  longe da Guerra e das ditaduras. 

A viagem para o Rio de Janeiro acontece, assim, em Novembro de 

1944 (tendo pernoitado em Dakar e no Recife) mas não se revelará 

definitiva, uma vez que Agostinho da Silva, com curiosidade pela 

educação dos vizinhos brasileiros, depressa se encaminhará para 

a Argentina e para o Uruguai. Por lá, e entre 1945 e 1947, lecciona 

na Escola de Estudos Superiores de Buenos Aires e nos 

Colégios Libres de Montevideu.
Regressado ao Rio de Janeiro entre o fim de 1947 

e o início de 1948, passa a trabalhar no 

Instituto Oswaldo Cruz, na Faculdade Fluminense 

de Filosofia e na Biblioteca Nacional (com Jaime Cortesão). 

Contudo, a que é que Agostinho da Silva se dedica mais 

nesses primeiros dez anos de Brasil? Dedica-se ao ensino, 

à escrita e à investigação. Ou seja, ensina Filosofia na 

Faculdade Fluminense (Niterói), História Antiga e Literatura 

Portuguesa na Universidade da Paraíba (a partir de 1952) 

e Literatura Portuguesa e Filologia Românica na 

Universidade de Santa Catarina (a partir de 1955); 

escreve e publica em jornais (nomeadamente o Estado de São Paulo) 

e edita os livros Um Fernando Pessoa(1955), Reflexão à 

margem da literatura portuguesa (1957) e também o Ensaio para uma 

Teoria do Brasil (1956); e faz investigação no Instituto Oswaldo Cruz

(onde se dedica aos estudos de entomologia), na Biblioteca 

Nacional e na organização da Exposição Histórica do 

IV Centenário da Cidade de São Paulo (1954/1955).
Em síntese, o objectivo de Agostinho da Silva era fazer no 

Brasil aquilo que fora impedido de fazer em Portugal. 

E o seu projecto educativo, que era naturalmente um 

projecto político (na medida em que a política deve 

estar ao serviço da cultura e da educação), consistia 

em defender uma educação para a liberdade, que 

valorizasse a acção e o homem no seu sentido 

integral, que levasse cada homem a reconhecer 

as suas responsabilidades, que tivesse participação 

efectiva na construção da vida e do futuro.


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