Por Aletho Alves*
Acordo assustada. Meu filho chora. Levanto da cama rapidamente. Ele
está sentado no chão com as mãos no pescoço. Olha pra mim e diz soluçando:
— Dói, mamãe.
A gripe piorou. São quatro e meia da manhã. Tenho de estar no trabalho
às seis, não posso faltar. Na verdade, nem atrasada posso chegar.
Anteontem, minha colega foi demitida por ter chegado uma hora
atrasada, já que os metroviários fizeram uma paralisação de trinta minutos. Eu
trabalho sem carteira assinada, não tenho seguro-desemprego e não consegui
terminar meu curso de técnica em enfermagem, pois os professores do ensino
profissionalizante nas escolas públicas estão em paralisação há mais de quatro
meses. Então, fico me perguntando: de que adianta eu ganhar ajuda financeira do
Estado se a minha única chance de mudar de vida é um caminho totalmente
incerto?
Desesperada, pego minha bolsa, coloco uma muda de roupa para o meu
filho em uma sacola plástica. Uma lágrima escorre pelo meu rosto, já sei que
perderei meu emprego. Mas a saúde do meu filho vem em primeiro lugar. Na
realidade, como posso mantê-lo saudável sem um real no bolso? Os pensamentos me
afligem. Vou ou não vou ao hospital? Para ir ao posto de saúde mais próximo
tenho de pegar dois ônibus e a esta hora da madrugada eles já estão lotados.
Oh, meu Deus, será que estou no inferno?
Não agüento ver meu filho gemendo de dor. Coloco-o no colo e vou ao
Posto de Saúde mais próximo.
São quinze para as seis quando desço do ônibus. Meu filho dorme.
Caminho alguns minutos. Chego, finalmente, ao Posto. A fila é enorme; não há
uma cadeira desocupada; a que encontro não tem encosto. Há gente que traz
aquelas cadeiras de praia. Só faltam as barracas, pois os colchonetes já estão
espalhados pelos corredores. É como se o mundo estivesse acabando e as pessoas
tentassem sobreviver como podem. O cheiro é horrível e a única pessoa de branco
é um rapaz que está tirando a blusa para enxugar o vômito de um velho deitado
no chão que eu suponho ser seu avô.
Finalmente, vejo uma enfermeira. Vou em direção a ela e pergunto:
— Onde fica a ala pediátrica?
— Minha senhora, o pediatra ainda não chegou.
— Certo, mas... O médico de plantão?
— Desculpe, ele não veio hoje.
Antes que pudesse questionar alguma coisa, a mulher foi embora. Parece
que todos os funcionários não se arriscam em conversar muito tempo com os
pacientes, pois têm medo de serem agredidos verbalmente ou, até, fisicamente.
Estou esperando atendimento há horas e já não sei se fiz o melhor
trazendo meu filho para este lugar.
Cansada, com fome, com medo, abaixo minha cabeça e vejo o rosto do meu
filho. Seus olhos estão fechados, sua face está pálida e o seu corpo parece
gélido. Percebo, então, que ele fez algo melhor do que eu: encontrou um lugar
melhor para viver.
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*Aletho Alves é estudante do 2º ano do Ensino Médio. Esta crônica
recebeu, em 2010, 1º lugar no 20º Concurso Literário João Herculino do Colégio
CEUB/Brasília, Brasil.
Imagem: Matizes Dumont.
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