Seu Saldanha, sapateiro cantador de moda de viola
por Eduardo Alexandre
SEM TELEVISÃO OU JORNAL, O REPÓRTER DO SERTÃO ERA O CORDELISTA, O CANTADOR
José Saldanha Meneses Sobrinho, 82 anos, 21 de Candelária, nasceu na Fazenda do Piató, Santana do Matos, e já aos 12 anos começou a fazer seus repentes, improvisos que levava às praças, seguindo, segundo ele, os repórteres do sertão: os cantadores e cordelistas.
Quando o pai o viu de feira em feira, com os cantadores mais velhos em suas farras festivas, aconselhou:
- Vou lhe ensinar tudo o que um sertanejo pode aprender. Tocar e improvisar você pode até fazer. Mas usar de viver de viola, faça isso não!
INDUSTRIAL
E Saldanha seguiu o conselho do velho.
- Fui do cabo da chibanca, vaqueiro, almocreve, aboiador, puxador de gado, fabricante de sapato, de doce e de queijo. Tudo, para dar educação aos meus filho.
Apesar de ter praticado tudo isso, Seu Saldanha foi mesmo um dos maiores industriais do calçado do RN, talvez o maior. Tratando todo mundo por portador, seu grande mestre na arte de fazer sapatos, sandálias e botas que calçaram os matutos do interior norte¬riograndense, foi seu Manoel Senhor, um sapateiro que ia à Fazenda do Piató calçar o povo do lugar.
Com ele, seu Saldanha iniciou um aprendizado que espalharia sapatos, os Calçados Menesses, por todo o Nordeste e até Rio de Janeiro, a então capital brasileira.
Mas Seu Saldanha, ao lado disso, nunca esqueceu o cordel.
Escreveu "O Nordeste e Seus Cangaceiros", "O Filho do Ferreiro", "Diz Tua Prosa, Sertão", tantos títulos, cento e oitenta ao todo, que seria cansativo enumerar a todos. Por ele, ainda estaria no Piató, mas a esposa, dona Jovelina Dantas, adoeceu e ele teve que vir morar em Natal, onde o tratamento era possível.
Vinte e um anos na Candelária, Seu Saldanha lembra o fato de ter desplantado uma macaxeira de onze quilos e treze palmos de comprimento no terreno onde hoje fica o Shopping.
Um assombro que foi até notícia de jornal, diz.
ESTÓRIAS
Hoje, ele pode ser encontrado no ponto comercial que mantém, o Recanto do Seridó, à rua Irineu Jofile, para uma prosa amena e gostosa, onde, com certeza, falará do filho do ferreiro que um dia prometeu dominar sua cidade, Cerro Corá, e que concretizou seu sonho, sendo vereador e prefeito várias vezes, história contada em cordel. Ou do matuto que chegou para comprar cigarro e como não encontrou onde comprasse, fumou a nota de 10 mil réis, ganha quando o algodão mocó era a riqueza do Seridó "e o orgulho do povo da região.”
Um homem cheio de histórias e estórias do sertão, com livros publicados e inéditos que precisam ser resgatados.
É um homem que diz que a maior universidade do mundo é o Nordeste, lugar ideal para a formação de um poeta.
Saldanha também fabricou suas próprias violas, e, de Lampião, diz coisas como essas:
Ele tinha uma estratégia
De guerra muito avançada.
Para enganar as volantes
Cobria uma retaguarda
Para dar tempo e abrir fogo
Ou fugir da emboscada.
Lampião tinha com ele
Uma perícia invejável
As investidas e pegadas
De maneira admirável
Ele enganava as volantes
De modo inacreditável.
Candelária Viva, 2000
Foto: Alexandro Gurgel (NET)
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